Sérgio Moro e o tabuleiro de 2026: uma candidatura entre a força da marca e a fragilidade da estrutura
- René Santos Neto
- 24 de set.
- 4 min de leitura

Por muito tempo, Sergio Moro foi o homem mais temido da política nacional. Símbolo da operação Lava Jato, a sua figura representava uma promessa de purificação moral da vida pública brasileira. Em 2018, seu ingresso no governo Bolsonaro como Ministro da Justiça e Segurança Pública foi visto por muitos como a primeira pedra de um futuro projeto presidencial. Mas, desde então, o roteiro se tornou errático, e a narrativa perdeu força. Agora, diante dos dados da mais recente Paraná Pesquisas, Moro volta ao centro do debate paranaense, e sua viabilidade eleitoral precisa ser analisada com frieza.
A pesquisa coloca Moro em posição de destaque na corrida pelo Palácio Iguaçu. Com 22,6% das intenções de voto na pesquisa espontânea e liderança isolada na estimulada com 31,4%, ele parece ter herdado uma parcela significativa do eleitorado conservador e bolsonarista no Paraná. Contudo, os bastidores da política paranaense revelam um cenário mais complexo do que os números frios das planilhas podem sugerir.
Forças: capital simbólico e recall nacional
O principal trunfo de Moro é seu nome. Mesmo após o fim da Lava Jato, sua imagem permanece fortemente associada ao combate à corrupção. Em um estado como o Paraná — berço da operação — essa associação ainda rende dividendos eleitorais. Soma-se a isso sua eleição ao Senado com mais de 1,9 milhão de votos em 2022, o que consolida seu recall entre o eleitorado conservador.
Além disso, a ausência de um nome bolsonarista mais competitivo no estado transfere a ele, por osmose, boa parte do apoio da direita radical e dos órfãos do ex-presidente. E por mais que as relações com Bolsonaro estejam esgarçadas, Moro ainda representa, para muitos, o perfil ideal de um político técnico e firme contra a corrupção.
Fraquezas: isolamento político e ausência de estrutura
Por outro lado, o isolamento político de Moro no Paraná é evidente. A recente tentativa de aproximação com o governador Ratinho Junior — detalhada nos blogs de política e relatada como “fora de agenda” — é um sintoma da fragilidade de sua articulação local. A forma como foi ignorado no evento do IPVA, citado apenas por dois oradores e sequer mencionado por Ratinho, é emblemática. Moro teve que forçar sua presença — e mesmo assim permaneceu nas margens do palco político.
Mais preocupante é a total ausência de estrutura partidária consolidada. O União Brasil, legenda à qual Moro é filiado, é uma federação complexa, com caciques regionais que não necessariamente se alinham com o senador. O racha com o Progressistas, que já lançou Cida Borghetti, revela o enfraquecimento da frente direitista e conservadora no estado — especialmente quando se considera que Ricardo Barros, arquétipo do pragmatismo fisiológico, mantém forte ascendência sobre a máquina estadual e não moveu uma palha em favor de Moro.
Oportunidades: fraqueza dos adversários e lacuna no campo da direita
Apesar dos obstáculos, o cenário oferece brechas. Alexandre Curi, hoje presidente da Assembleia Legislativa, é o nome natural do PSD para a sucessão de Ratinho, mas ainda enfrenta resistência no eleitorado por ser considerado um político tradicional, pragmático e pouco conhecido fora da elite política. O grupo do governador precisará trabalhar duro para transferir seu capital político — e essa operação sempre tem grau de incerteza.
Além disso, com o campo da esquerda desorganizado no Paraná — sem nomes fortes do PT ou do PDT no horizonte —, Moro pode polarizar com o candidato do Palácio Iguaçu e, mais uma vez, se apresentar como o “outsider” com verniz técnico. Se conseguir articular apoios em cidades estratégicas (como Curitiba, Londrina e Maringá) e compor com setores empresariais que se sentem desconfortáveis com o “estamento político tradicional”, poderá surpreender.
Ameaças: o pragmatismo de Ratinho e a máquina estadual
Mas as ameaças são igualmente consideráveis. Ratinho Junior é hoje o governador com maior capital político do Brasil. Seus índices de aprovação são elevados e, diferentemente de outros líderes regionais, seu perfil híbrido — conservador nos costumes, liberal no discurso econômico e desenvolvimentista na prática — dialoga com amplos segmentos do eleitorado.
Ratinho não está em busca de protagonismo nacional a qualquer custo. Pode optar por fortalecer um aliado de seu círculo mais íntimo — como Curi ou outro nome do PSD, como Guto Silva — e usar sua base de prefeitos, deputados estaduais e federais para consolidar a candidatura. Nesse cenário, Moro seria empurrado para a periferia da disputa, ainda que mantenha seu eleitorado fiel.
Ademais, as rusgas com figuras centrais do governo estadual, como o secretário do Trabalho (Do Carmo) e o distanciamento de outras lideranças partidárias, indicam que Moro ainda não conseguiu transformar seu recall eleitoral em uma coalizão viável. A eleição de 2026 pode ser cruel para quem não dominar o tabuleiro.
Análise final: entre o símbolo e a estrutura
A eleição de 2026 no Paraná será um teste para a resiliência da marca “Moro” e para sua capacidade de transitar no mundo político tradicional. A estratégia do senador, até aqui, tem sido de alto risco: confiar no carisma e na fama passada, mantendo-se como um “outsider moral” em um sistema cada vez mais dominado pelo jogo de bastidores.
Mas os dados da Paraná Pesquisas também mostram que o eleitor ainda o enxerga com simpatia — sobretudo na Região Metropolitana de Curitiba, onde concentra seus maiores índices de intenção de voto. Se conseguir compor com setores médios, com os quadros técnicos do funcionalismo e com o empresariado urbano, poderá reverter o isolamento político. Mas para isso, precisa abrir mão de parte do seu discurso de pureza e dialogar com a realidade pragmática da política local.
A visita ao Palácio Iguaçu foi um sinal. Não importa se Ratinho o chamou ou não. O que importa é que Moro foi. E este gesto, simbólico e audacioso, indica que o ex-juiz está disposto a jogar o jogo. A pergunta que fica é: será que o jogo ainda tem lugar para ele?
Referência da pesquisa:
Paraná Pesquisas. Pesquisa Estadual: Curitiba e Região Metropolitana. Agosto de 2025. Registro no TSE: PR-04025/2025.
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