Vítima das próprias escolhas que fez em prejuízo a jovens promissores políticos em 2022, em uma lição cármica, Álvaro Dias provavelmente ficará sem a cadeira que ocupou por décadas no senado.
Álvaro Dias nasceu a uma distância aproximada de 100km do Paraná, na cidade de Quatá, em São Paulo, em 1944. Em 1969 já exercia, aos 24 anos de idade, seu primeiro mandato como Vereador na cidade de Londrina, no Estado do Paraná.
Poucas pessoas no Paraná não apertaram a mão do notável político, que passou pelo MDB, PPR (antigo PP), PSDB, PDT, PV e agora é filiado Podemos.
Álvaro Dias foi lançado ao estrelato por José Richa, que proporcionou sua eleição ao Senado em 1982 e, depois, ao Governo do Paraná em 1986.
Foi nessa época, com o velho José Richa, que Álvaro Dias aprendeu a realizar a operação “limpa trecho”.
José Richa ensinou a Álvaro Dias que a eleição não é ganha na urna e sim meses antes por meio de acordos políticos, nos quais são enterrados eventuais opositores que possam até mesmo ter maior representatividade eleitoral.
Álvaro Dias não retribuiu o apoio que José Richa esperava, já em seu discurso de posse como governador, em 1987, ao lado de Richa, teceu pesadas criticas ao governo e fez da sua “reforma administrativa” uma verdadeira caça aos correligionários e protegidos de Richa. Esse memorável dia é nossa escolha de foto.
Muitos não sabem, mas Roberto Requião é cria política de Álvaro Dias, que botou a máquina do governo estadual e municipal para trabalhar na campanha de prefeito de Curitiba, em 1985, depois o nomeou secretário da poderosa Secretaria de Desenvolvimento Urbano em 1989 e 1990.
Para beneficiar Roberto Requião, Álvaro Dias chegou a deixar de renunciar ao Governo do Paraná, em 1990, para não correr o risco de atrapalhar a eleição do seu pupilo político à época.
Importante mencionar que a eleição de 1990 contou com a maior fraude eleitoral que se tem notícia: A invenção por parte da campanha e aliados de Requião, de um falso pistoleiro chamado Ferreirinha, uma Fake News que selou a vitória de Requião sobre Martinez e garantiu seu primeiro mandato como governador. Martinez veio a falecer em 2003, em um pouco explicado acidente aéreo.
Álvaro Dias, em 1997, já fez parte do Governo FHC, comandando como presidente a poderosa estatal Telepar e em 1998 fez uma espécie de acordo branco com Jaime Lerner para garantir sua eleição ao Senado em 1998, cadeira que ocupa até hoje.
Já senador, em 2002, Álvaro Dias fez outro acordo branco com Lerner para ter a máquina governamental trabalhando para ele na eleição a governador de 2002. Deu errado e Álvaro Dias perdeu para seu ex-pupilo e agora desafeto, Roberto Requião, época que o Álvaro Dias o apelidou e “maria louca” e “napoleão de hospício” em diversos discursos inflamados.
Em 2006 e 2014 Álvaro Dias promoveu, com maestria, operações "limpa trecho" com os governadores de ocasião (Requião e Beto Richa) para facilitar as eleições ao Senado. Ainda assim ficou por um triz em 2006 quando quase perdeu a cadeira para a histérica Gleisi Hoffmann. Pois em 2022, ao novamente aplicar a antiga técnica “limpa trecho”, deu tudo errado.
Em 2022, Álvaro Dias completou 53 anos exercendo, pelo Paraná, ininterruptamente, sucessivos mandatos em cargos eletivos, a maior parte deles em cargos majoritários de Senador e Governador. Tanto tempo ininterruptamente em mandatos eletivos é comparável a apenas algumas poucas figuras do norte e nordeste.
E toda essa experiência faz de Álvaro Dias, hoje um dos mais habilidosos e experientes políticos em Brasília, com um poder de articulação notável.
No início de 2022 o Podemos do Paraná era uma potência. Com três senadores exercendo mandato, César Silvestri Filho como presidente, despontando como opção forte ao Governo do Estado, Sérgio Moro como quadro político relevante, vice-presidente do partido, e Deltan como importante quadro a deputado federal.
Com nomes assim parecia que nada poderia parar o Podemos do Paraná, que certamente teria um forte nome à presidência da república, governo do estado uma votação esmagadora para o parlamento federal e estadual.
Mas aí veio a “limpa-trecho”, dessa vez desastrosa, quando Álvaro Dias decidiu sacrificar o acervo político conquistado pelo partido em trocas para garantir sua recondução ao Senado em aliança com o estamento burocrático local, representado pelo governador Ratinho Júnior.
Procurando garantir mais um mandato, Álvaro Dias tentou de tudo para se aliar com Ratinho Júnior e com isso interrompeu, de forma abrupta, o projeto do Podemos do Paraná para o Governo do Estado com César Silvestri Filho, que, em cima da hora, se viu obrigado a sair do partido.
Fez o mesmo com Sérgio Moro, o obrigando a sair do Podemos em cima da hora em razão de ter participado da sabotagem de sua candidatura à Presidência da República.
Graças a Álvaro Dias, deu errado para todo mundo: César Silvestri ainda assim manteve a candidatura ao Governo do Estado, dessa vez no PSDB, para então ser traído por Rossoni e Beto Richa, que bloquearam sua candidatura ao Governo na convenção partidária. Sérgio Moro, por sua vez, teve que sair do Podemos e foi sabotado pelo União Brasil, em uma verdadeira armadilha, e se viu obrigado a buscar, alternativamente, o Senado Federal pelo União Brasil, não sem enfrentar resistência.
Apesar de Álvaro Dias arrebentar com o Podemos do Paraná para tentar garantir o apoio de Ratinho Júnior, o governador decidiu apoiar oficialmente Paulo Martins, aderindo a acordo com o presidente Bolsonaro.
Com isso, Álvaro Dias ficou em uma situação complicada.
Sem ter pra onde correr, vendo que sua cadeira no senado está efetivamente ameaçada, Álvaro Dias fez algo impensável. Aliou-se com o PT, que sempre jurou combater, em especial por conta de corrupção, ajudando, para o assombro de muitos, justamente Maurício Requião a retornar ao TCE-PR, em uma decisão jabuticaba do STJ.
E depois de toda a história, em especial propalar ser lavajatista, contrário a corrupção, ter apoiado ferozmente o impeachment de Dilma, para derrotar Moro, Álvaro Dias se vê em “acordo branco” com Roberto Requião, sentando a mesa com Gleisi Hoffman e Lula. Havia surfado em outras ondas e hoje volta de pires na mão. Quem diria?
Fato interessante na semana foi o ataque jurídico do PT aos candidatos ao Senado, Moro e Paulo Martins. Álvaro Dias, com similar irregularidades, foi poupado. Aliança vai bem.
Com a possível saída de Álvaro Dias, o senado se viu recentemente palco de sentimentais defesas de seus pares. Dentre a vozes que defenderam efusivamente a permanência de Álvaro Dias no senado estavam: 1. Senador Oriovisto Guimarães, notório por ser contra o impeachment de Dilma; 2. Senador Nelsinho Trad, que atualmente está com os bens bloqueados em ação de improbidade administrativa em monta aproximada de 655 milhões de reais; 3. Senador Confúcio de Moura, que igualmente está envolvido em imbróglio de 57 milhões de reais; 4. Senador Cid Gomes (irmão de Ciro Gomes e notório operador de trator), também complicado em relação à JBS, em uma monta aproximada de 25 milhões de reais; 5. Senador Jader Barbalho, infame pela sua condenação no caso da SUDAM, e, por fim; 6. Senador Romário Faria, que é notável pelos seus rolos judiciais.
Verdade seja dita, hoje a principal ameaça à cadeira de Álvaro Dias é Moro, que é detestado por todos esses que vieram defender Álvaro Dias. Moro não é político, é detestado pelo estamento burocrático e existem chances de Moro ser tirado da disputa pelo TSE ou STF em razão da contaminação política institucional. Essa é são hoje as principais apostas de Álvaro Dias.
A estratégia de Álvaro Dias parece focar justamente na rejeição de Moro e o voto útil para que Moro não o vença ao Senado. E, ainda que Moro tenha mais votos, confiar no estamento burocrático para que tire judicialmente Moro da disputa.
O fato é que Moro tem voto. Muito voto e não precisa pesada estrutura ou conchavos com “lideranças” para atingir seus eleitores, ele consegue dialogar com eles diretamente. Isso é uma característica das lideranças anti-estamento. E pelo andar das pesquisas as chances de Moro ser vitorioso são elevadíssimas.
Todas essas circunstâncias colocam Álvaro Dias, e sua história e carreira política, em um melancólico crepúsculo, colorido por tons de todas as bandeiras partidárias que carregou, do azul ao agora vermelho.
Isso é política.
* Na foto (autoria desconhecida) está discursando Álvaro Dias na ALEP durante posse como Governador do Estado em 1987. Ao lado está José Richa, principal apoiador e tutor de Álvaro Dias, escutando este último tecer duras críticas ao seu governo, literalmente imediatamente após ser empossado.
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